quarta-feira, 2 de junho de 2010

COMO SE FORA UM CONTO - NÃO HÁ MACHADO QUE CORTE A RAIZ


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NÃO HÁ MACHADO QUE CORTE A RAIZ
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Logo depois da revolução, e numa época de luta geral contra o que estava mal no nosso País, um poeta escreveu que não havia machado que cortasse a raiz ao pensamento. Durante décadas, a luta e o pensamento correram livres. Sucederam-se os governos, as reformas e as lutas, e ao fim de trinta e tal anos chegamos aos dias de hoje.

E, nos dias de hoje, que vamos encontrar de diferente? Que ganhamos nós com a luta, os pensamentos e as reformas, para além de acabarmos por ter um governo como o que actualmente nos desgoverna?

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Podemos falar livremente e por isso podemos ofender e insultar sem que nada de grave nos aconteça.

Podemos roubar livremente, desde que sejam valores obscenamente avultados, que se for um pão ou uma maçã, vamos para a cadeia.

Aos dezasseis anos, uma adolescente pode fazer livremente um aborto, mas não pode decidir colocar um piercing.

Aos dezoito anos um, agora adulto, recebe duzentos euros de subsídio do Estado, podendo assim continuar a não trabalhar, mas um idoso recebe de reforma duzentos e trinta e seis euros depois de uma vida inteira de trabalho.

Os professores são diariamente enxovalhados, insultados, e até sovados pelos alunos, mas o nosso governo desculpabiliza a situação imputando as culpas a causas sociais.

É proibido consumir drogas nas prisões do nosso País, mas são distribuídas todos os dias, seringas para controlar o HIV.

Se um jovem de quatorze anos matar alguém, nada lhe pode acontecer pois não tem idade para ir a tribunal, mas se o mesmo jovem levar uma bofetada do pai por ter roubado dinheiro ou por outra qualquer razão, tal é considerado violência doméstica, e o paizinho pagará por isso.

Se a uma família acontecer uma desgraça e ficar sem casa, tem de se socorrer de amigos ou amizades, se os tiver, ou viver conforme possa, muitas das vezes ao relento ou em bairros de lata, já que o Estado não tem dinheiro para lhe fazer uma nova. Mas se seis energúmenos estiverem presos numa cela que foi inicialmente projectada para quatro deles, sem terem , coitados, quarto de banho privado, a Associação dos Direitos Humanos faz queixa da situação ao Tribunal Europeu.

Se uma criança estiver a trabalhar numa qualquer fábrica antes de ter, oficialmente, idade para tal, isso é considerado exploração do trabalho infantil, passível de prisão, mas se por outro lado o trabalho for, a participação em gravações de telenovelas ou em concursos televisivos, é o talento que está a ser aproveitado, mesmo que trabalhe oito horas por dia, ou mais.

Se precisarmos de uma seringa para ministrar uma injecção, vamos a uma farmácia e pagamos o que nos pedirem, mas, se fossemos drogados, não pagávamos nada.

Se se for homossexual, quereremos e poderemos casar, mas se formos heterossexuais, limitamo-nos a juntar os trapinhos, que a vida não está para brincadeiras.

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Muitos outros exemplos se poderiam dar. Correm diariamente pela internet, textos, a denunciar situações de bradar aos céus, mas como é habitual em nós, nada fazemos, e enquanto nada nos acontecer directamente, olhamos para o lado e assobiamos a disfarçar.

Terá sido para isto, e muito mais do género, que alguns fizeram uma revolução, outros a continuaram, e a quase totalidade apoiou?

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Infelizmente parece que ainda não fizeram um machado que acabe por cortar a raiz à árvore em que nos obrigam a viver.


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